Coleção
de cartão-postal de Joanco
segunda-feira, 31 de outubro de 2016
domingo, 23 de outubro de 2016
sábado, 15 de outubro de 2016
Crônica
buenairense-montevideana, 2016
Capítulo 3
Nariz
empinado, corpo empertigado e síndrome de estados-unidos ● Glamurosa
cidade com bancas miseráveis ●
Buenos Aires es leyenda ●
Boa comida em pequenos lugares ●
Esplêndida pitsa ●
A feira central de Campo Grande foi assassinada ● A suíça americana
e as siberianas ● O
oceano de livro e a livraria mais bela ● Vocabulário argentínico ●
Uma pitada de geopolítica
O caso é que não encontrei o argentino empertigado, de nariz
empinado, da visão do livreiro de Bogotá, estereótipo que causa antipatia, além
do policial do guichê do aeroporto na chegada.
—
Quantos dias ficarás? Qual hotel?…
Então se
descuidar os brasileiros viram imigrantes ilegais e ficam morando lá de vez? O inverso
ainda vá, mas… então ainda pensam que são a suíça
americana? Não é só no Chile que aparece autoridade com síndrome de
estados-unidos.
As autoridades
é que estragam a imagem dum país, que o povo custou tanto erigir.
Assim como
quem estraga um idioma são os gramáticos e os jornalistas.
O que
vi foi gente de todo tipo, como aqui e noutros lugares, nada a ver com a imagem
estereotipada dos locutores de jogo e futebol na televisão. Cada um muito
ocupado em ganhar a vida, sem espaço pra pensar em rivalidades artificiais.
Sorte ter levado uma jaqueta impermeável. Ali, sim, seria a
terra da garoa. Finíssima. Parecia espalhada por esprei ou aerossol. Assim fui
bater perna, abrigado pelas marquises, andando bem rente, em direção à avenida
Rivadavia, onde tem uma praça com banca de livro.
Mas antes achei outra no caminho, quase chegando. Das várias
algumas abertas. São daquelas bancas (em castelhano quiosco ou kiosco)
antigas, um cubículo de área de cerca de 2×1m2, tão pequena que o banquista não
entra, veste. Ali um simpático e atencioso senhor de fisionomia indígena atendeu,
puxando cada caixote empilhado separado por gênero, pra eu ver tudo. O pessoal
usa criatividade com falta de espaço. Com tanto espaço na praça, as bancas
minúsculas, cubículos, praticamente caçambas.
Esporadicamente ventava forte, só um sopro. Então sentia um
pouco de frio. Felizmente o sopro era esporádico e assim ficou. Dava dó ver os
livros naquele ambiente inóspito, mas milagrosamente os livreiros conseguiam
defender suas peças.
No fim fui atrás dum banco pra sacar com cartão. Entrei a
uma verduraria pra perguntar. O pessoal ouvia um cliente cantar, certamente um
bolero.
Na última encontrei o volume 1 de Buenos Aires es leyenda - Mitos urbanos de una ciudad misteriosa,
de Guillermo Barrantes & Víctor Coviello, editorial Planeta. Nos dias seguintes achei os outros três volumes.
Umas quadras a diante cheguei à tal praça da Rivadavia,
também com umas e outras bancas abertas. O engraçado é que edições argentinas,
como Leoplán, não se acha tão fácil. Narraciones terroríficas, de editorial Molino, que achei em Santiago, Lima e
Bogotá, ali não. Billiken na feira de
Montevidéu.
É um labirinto de bancas, essas um pouco maior, em condição
muito precária. Uma, dum senhor bem velhinho, onde tinha um exemplar de Leoplán, era uma montanha de livros e
revistas, dificultando muito garimpar. Tudo rente à garoa. A todo momento
despencava um, quase caindo na cabeça. Os livreiros se viravam como podiam,
cobrindo com plástico ante a possibilidade de chuva ou garoa com vento. Noutra
banca, no oco da lombada dum livro fez morada uma linda aranha branca.
Eu não tinha onde pôr minha pequena sacola de viagem, pois o
chão estava molhado em toda parte, tendo de pedir ao banquista a deixar dentro.
A prefeitura deveria melhorar aquela condição precária.
Fornecer bancas maiores, fazer um teto geral, nem que fosse de lona. Poderia
colocar teto de alumínio, como tem nos estacionamentos de atacadão aqui e nos
eventos musicais ao ar-livre. Tal indigência
num ponto cultural de referência não deixa de ser vergonhosa.
Campo Grande, num lado, resolveu o problema dos camelôs
ambulantes, coisa que São Paulo não conseguiu, os instalando numa área toda
coberta, cobertura metálica quente pra danar, mas toda coberta e fechada. O outro
lado da moeda é que uma política fiscal truculenta e excessivamente
regulamentar tolhe a criatividade e a cidade perde o charme dos ambulantes,
como tem em Bogotá, Santiago e Curitiba, por exemplo.
Já o caso da feirona, caso que tanto se gaba, de que foi
transferida à antiga estação ferroviária, é mentira! É uma farsa!
Quem conheceu a feirona não se deixa engambelar por essa
tapeação.
A feirona foi extinta, extirpada, desmanchada. Foi uma
imensa perda cultural da cidade, abafada pela ignorância e alienação dos
habitantes e maquiavelismo dos governantes.
É preciso muita imaginação e doses de cachaça pra se
convencer de que aquilo é a feira central, e que só mudou de lugar.
O que tem lá na ferroviária são restaurantes padronizados,
tudo igual do começo ao fim, um pequeno camelódromo. Verdura e fruta quase nada.
Tudo ao gosto da máfia dos supermercados, pra acabar com as feiras.
Um colega de trabalho cuja família é feirante contou que os
feirantes são muito ignorantes e desunidos. Não se unem pra defender seu
interesse. Assim a máfia supermercadista que nos envenena lentamente
deita-e-rola.
Almocei no Mística,
Rivadavia 5499, pequeno restaurante-café, onde uma linda e simpática garçonete
serviu filé de merluza. Como antepasto sempre uma sopinha, o que caiu muito bem
naquele meio frio, e pãozinho com patê. Mas um pãozinho com massa bem rústica.
Pra beber tinha pomelo, a laranjona que tenho no quintal. Mas era um
refrigerante, certamente artificial. Então a opção teve de ser cerveja. Tinha Quilmes, mas essa, além de ser muito
industrial foi comprada pela Brahma.
Se continuar abrasileirando eles… Ai, ai!, parodiando a famosa canção, Lloraré por tí, Argentina…
Dali voltei ao hotel em táxi, cerca de 16h. Como o tempo foi
se fechando mais decidi dormir pra recuperar as muitas horas de vigília. Sábia
decisão, pois doravante fez tempo aberto, sol e temperatura agradável.
Os táxis são muito baratos lá. Só teve um que não sabia ir
ao hotel, tão no centro, e me transferiu a um colega que estacionou ao lado num
sinaleiro. Por isso é bom levar no bolso as coordenadas GPS do hotel. Sempre
que chego de viagem peço um cartão do hotel pra ter sempre no bolso. Assim o
taxista já lê nome e endereço rapidinho e não corro o risco de me perder ao
esquecer nome e endereço do hotel.
O taxista que falava sobre Brasil e Argentina disse que no
Brasil dão valor ao real e não dão bola ao dólar. Que o povo argentino é muito besta, que despreza a própria
moeda. Até põe casa a venda em dólar. Um absurdo!
Outro, com fotos de duas lindas indiazinhas de cabelo
corrido no porta-luva, suas filhas, disse que tem saudade do tereré, que
conheceu com amigos paraguaios. Disse que já entende bem português porque tem
muito passageiro brasileiro. Disse que pensou que eu morava ali porque falo
fluente. Que se nota sotaque que seria doutra região mas que seria um
hispânico.
Os taxista em geral simpáticos, dando dica. Um explicou minuciosamente
onde é a grande feira de livro dos domingos e como chegar até lá.
No dia seguinte, um passeio complementar na praça na
Rivadavia, pra em seguida correr a outro endereço selecionado. Aquela história
de otimizar o processo, tentando um arranjo de maior proveito e economia.
Pra almoçar, como em Lima, se anda muito até achar um
restaurante. Quando entrei achei a decoração muito parecida à do Mística. Olhando bem a decoração vi que
só podia ser ele. Sem dúvida, quando apareceu a garçonete do dia anterior.
Nesse dia tinha fruto-do-mar com arroz, com a sopinha e o pãozinho com patê como
antepasto. Uma deliciosa moqueca fumegante numa tigela de barro.
Um desses restaurantes-lanchonete com algo diferente, é o Puerto Rico, Junín 378. Não confundir
com o tradicional café La Puerto Rico.
À entrada um grande balcão de vidro com grande variedade de omelete, filés à
milanesa, tortilhas, coxinhas, todos enormes. Pedi uma tortilha, uma omelete e
uma coxinha (coxona) recheada de queijo derretido. Quem viu deve ter pensado
que sou um grande comilão, mas já combinara com o garção, comer um pouco e
levar o resto.
O Puerto Rico fica
quase na Correntes, na altura da 9 de Julho, onde tem muitos sebos. Quer dizer,
mais-ou-menos sebos, que infelizmente vão se descaracterizando, uns só com
alguma prateleira de usados, outros assumidamente de novos.
Decidi ir a uma pitsaria recomendada na internete, a Güerrín, Corrientes 1368. No balcão da
frente estava lotado na tarde mas no fundo tinha bastante mesa vaga. Tem pouca
opção se pedir fatia. Mas quê fatia! A massa é mais fina. Tão delicada que nem
se nota muito. O queijo estica tanto que se chupa como macarrão quatro vezes
antes de quebrar. Nada mau acompanhada de chope numa espessa caneca de vidro.
Nada a ver com as fajutas de Campo Grande, onde fazem um
creme na base dalguma gordura vegetal hidrogenada e chamam de 4 queijos, 5 queijos…,
que deve entupir coração…
Um conhecido aqui disse que só compra queijo quando vai a
Aquidauana, porque os queijos de Campo Grande, ou melhor, Buracópolis, é tudo
com amido, maisena, pra dar consistência.
É por isso que se faz dieta, não dá certo, e não se sabe por
quê…
O povo sempre tem na cabeça a idéia, espécie de arquétipo,
de que é em Bons Ares onde tem mais livro. Nada a ver. A quantidade de livro é
comparável a Rio de Janeiro e São Paulo. Nem de longe se compara ao oceano livresco
que são Lima e Bogotá.
Pode ser que sejam mais leitores. Na capital são muito
educados como pedestres. Mas, como disse Ramão, os argentinos nos hotéis
brasileiros são muito mal-educados na refeição.
No livro Historias de
Montevideo mágico, o autor disse:
[…] O velho ditado
de que somos a suíça americana, onde
campeia a razão e a modernidade globalizada do século 21 não impediu nossa gente
conservar seus relatos mágicos, ao mesmo tempo reais, e que estaria muito mais
perto dos conjuros populares que da fria lógica mercantil e utilitária.
Será que os dois hermanos
do cone sul pensam que isso ainda está vigente? É coisa lá do comecinho do
século 20. Dizque as duas suíças americanas não tiveram sustentação porque era
dinheiro nazista. Dizque… Sei-lá. Não estou suficientemente experto no assunto
pra filosofar encima.
É como aquela de que a mulher brasileira é a mais bonita,
que usa biquíni minúsculo enquanto as outras são cheias de pano. Esqueças. Já-era.
É dos anos 1980. A brasileira, pra-lá de convencida, ficou a trás, comendo
poeira.
Me lembro, cerca de 2008, quando passou uma reportagem sobre
a Sibéria. Eu disse:
—
Rapaz! Cê viu as siberianas? Fiuuuuuu!
— Pois
é. Não acredito que a brasileira seja a mais bonita.
A livraria El ateneo
grand splendid foi eleita pelo jornal britânico The guardian a segunda livraria mais linda do mundo. A primeira é a
livraria a Selexyz dominicanen boekhandel,
na cidade holandesa de Mastriste. Um antigo teatro. No fundo, atrás das
cortinas abertas, a cafeteria. Quatro andares de sacadas, donde certamente se
via a peça com binóculo-de-teatro. http://www.buenosairesturismo.com.br/passeios/livraria-ateneo.php
Diz que o lugar existe por causa duma lei quanto ao
patrimônio histórico. Que se não fosse a tal lei o lugar há muito estaria
demolido pra dar lugar a algum prédio prafrentex.
Assim como no linguajar gaúcho tem muito hispanismo, na
Argentina tem muito lusitanismo. Lá bondi
é ônibus, garrafa é garrafa,
garrafão, bomboneira, botija, botijão de gás. Às vezes aparecem palavras que
não tem no dicionário RAE, real academia espanhola. Tem vez que a custo se acha
o significado, pesquisando na internete, como espaguetizar. Num artigo apareceu o termo sobre a matéria
espaguetizada num buraco-negro. Significando desmaterializar, moer, decompor,
esmagar, com analogia à massa que é amassada, saindo como fios de macarrão.
Mas noutro artigo a manchete Eran
feitas niñas, ahora son bellas
mujeres (Eram [*?] meninas, agora são belas mulheres).
Em castelhano hecho é feito, hacer é fazer. Em nenhuma
pesquisa apareceu feita, feitas, feito ou feitos em
castelhano.
Se procuras uma loja que vende sacola de viagem ou
penduricalho pra pôr nome e endereço na mala, procures uma marroquinería, que
originalmente é loja que vende artigo de couro.
Mais um artigo sobre os paraguaios fundando Buenos Aires:
Anos atrás um brasileiro postou um vídeo iutúbico defendendo
a tese de que o Brasil nada tem a ver com e não deveria apoiar a reivindicação
argentina de posse às ilhas Malvinas. É óbvio que o sujeito nada entende de
geopolítica. Uma base da Otã no arquipélago barraria o acesso brasileiro à
Antártica.
Espero que Putin não acabe só com o dólar. Também com o
inglês como língua-geral.
Um governo mundial é algo muito interessante. O problema é
sob quem.
segunda-feira, 10 de outubro de 2016
Iván Martínez (Gran misterio) - Manuel Belgrano
Crônica
buenairense-montevideana, 2016
Capítulo 2
O
mistério da toalha-de-banho ●
Cadê a arroba? ● E
agora, José: Como sair da conta? ● Considerações filosóficas
sobre cultura e estereótipo ●
Filosofança sobre beleza ●
Paraguaios fundaram Buenosaires
Um lapso de memória e eu disse Morris Albert. O dueto que não seria chorinho mas chorão é Leonardo
& Demis Roussos.
No aeroporto buenairense uma opção é o guichê de táxi onde
se paga ali mesmo. Tem dois lado a lado. O céu encoberto por grossa capa
cinzenta não era seco e dia claro como em Lima. Muito úmido e escurecido como
num crepúsculo, como em ocasiões em nosso inverno.
O elevador do hotel Pop
pra chegar ao segundo andar parece que foi ao vigésimo. Mais uma sensação de
câmera lenta. A porta usa aquele muito prático sistema de cartão magnético onde
a energia só liga quando depositado num leitor ao lado do interruptor. Assim o
hóspede não precisa entregar chave à portaria ao sair.
A escada (também o de Montevidéu) é de emergência, de modo
que o hóspede só tem o elevador. No banheiro só tinha a toalha-de-rosto,
dobrada sobre o rodapé do box. Então fiquei na dúvida se era toalha ou tapete.
Se não tem a outra, decerto é tapete, pensei, e a deixei no chão depois de
improvisar como toalha-de-banho. No dia seguinte apareceu dobrada noutro lugar.
Então deve ser toalha mesmo. Só dias depois percebi a toalha-de-banho no
míni-armário, onde tem uns cabides. Achei muito bizarro isso: A toalhinha no
banheiro e a toalhona no quarto! Será, que por ser frio, o argentino toma só
uma ducha e só se precisar toma banho com sabão? Não deve ser, porque o clima é
como o do Rio Grande do Sul, e no verão fica muito quente.
Nas viagens em geral notei que os hotéis não usam tapete, exceto
os todo atapetados, e são muito carentes em pendurico em banheiro. Não se acha
um pino pra pendurar uma cueca, toalha, sacola. E um pedaço de pano servindo de
tapete na saída do box é essencial pra não molhar o chão.
Meu quarto tinha três camas. Então é baixa temporada e os
quartos ficam sobrando.
Na área diante do quarto e do elevador dois computadores. A
área internética. Muito raro ver alguém entrando ou saindo doutro quarto ou
ouvir ruído interior. Não vi alguém usando internete. Talvez noutro andar. O
movimento na portaria também era escasso.
O desjejum consistia num saquinho de papelão, o típico
saquinho pra pão, cuma fita grampeada servindo de alça, contendo um par croassã
doce (Eu diria semi-doce. Na verdade é uma variedade de pão-doce), ali chamado medialuna (meia-lua), insosso, com massa
mal assada, pendurado na maçaneta da porta às 8h da manhã. Todo dia o mesmo par
de enjoativa meia-lua. Não varia. Comprei um potinho de mel, pra ver se
melhorava a meia-lua, mas nem assim.
O atendimento na portaria é muito simpático. Não é a
cordialidade séria do brasileiro. São sorrisos. Procuram ser simpáticos mesmo.
Um me ajudou a comprar a passagem de barco a Montevidéu na internete. Subiu até
a área internética e mostrou passo-a-passo como fazer. E já fala português.
Estando no exterior não se deve esperar um teclado ABNT2, é
claro. Eu não me lembrava do código ASCII da arroba, por isso tive de perguntar
como teclar arroba, pois aparecia no teclado como a terceira opção, que seria
com alt-gr mas não funcionava. É bom
lembrar que em qualquer teclado, pois é padrão, é alt-64 ou alt-0064
(apertar a tecla alt junto com os
números e soltar), então aparecerá @.
O ruim são os teclados de brinquedo, que viraram praga, onde
é impossível datilografar. Meu teclado é pesado, teclas firmes e altas, não
aquelas chatas e moles, que não respondem e ora batem duplo. É difícil achar
teclado de verdade no mercado. Por isso e pelas diferenças de programas
instalados em viagem evito ao máximo usar internete. Aquele atendente teve de
repor o navegador Cromo (ou Crome, sei-lá), pois o Explórer é obsoleto. Disse
que o Cromo deveria estar instalado. Então o repôs. Mas o problema maior é o
seguinte:
Pra acessar internete entro em minha conta. Ao terminar saio
dela. Então abri o Cromo de novo, pra testar se saiu mesmo. E minha conta abria
automaticamente, como se em casa. O jeito era reiniciar mas tinha momento em
que avisava que isso derrubaria todos os outros que estavam na linha ali (os
outros hóspedes, suponho) e que perderiam tudo não salvo. Felizmente logo mais
tinha ninguém. E se fosse alta temporada? Muito incômodo. Mais uma trapalhada
dos programadores microssófticos.
Os avisos (também em Montevidéu) não são só em castelhano e inglês
mas também em português.
Muito perto, a duas quadras, a avenida Corrientes, imensa
avenida que lembra muito o agitado centro paulistano.
A cidade parece mesmo São Paulo. Muito diferente de Bogotá,
Lima e Santiago. Mas é uma multidão muito educada. Os carros não avançam contra
o pedestre ao virar esquina nem buzinam por qualquer coisinha. Nem sombra
daquela buzinação louca de Lima. Os pedestres esperam pacientemente abrir o
sinal e atravessam na faixa. Como Ramão disse sobre as filas pra cinema e
ônibus: Todo mundo enfileirado. Ninguém é espertinho. Nesse quesito de educação
dão banho de 10×0
nos brasileiros.
As figuras dos bonequinhos nos sinaleiros pra pedestre (Todos
funcionando, diferente de nossa triste Buracópolis) são brancos, de longe
parecendo meio azulados, em vez de nosso costumeiro verde.
O asfalto é liso, sem remendo e sem buraco.
Minha visão foi dum povo educado e simpático. Mas Ramão não
gostou muito. A vendedora do sebo Hamurábi, que quando até lá foi e saboreou um
alfajor de verdade no café Tortoni,
disse que não achou o povo essa simpatia toda.
Era o que estava discutindo com Ramão há pouco. Serão
segmentos sociais diferentes? Meu contato foi basicamente com os hoteleiros e
livreiros. Quase não fui a loja. Seria como julgar São Paulo baseado só num dia
visitando as lojas de tecido dos turcos. Só numa casa de chocolate o vendedor,
um senhor gordo, com preguiça até de ir à vitrine confirmar se tem este ou
aquele, teve o comportamento típico do vendedor descrito por Ramão, mas o que
vi era um evidente caso de distimia.
Um taxista, perguntando sobre Dilma, disse que espera que o Brasil
fique bem:
— Temos
de reconhecer que o Brasil é o gigante cujos passos são seguidos pelos povos do
continente, se queira ou não.
É melhor esquecer toda aquela ambientação idiotizante dos
locutores desportivos, pois aquela rivalidade exacerbada é artificial.
Outro taxista é fã de Ayrton Senna. Disse que o cara era especialista
em pista molhada. Enquanto todo mundo penava na pista molhada, Senna fazia
gato-e-sapato. Eu disse que Senna é o bruceli da fórmula 1. Bruce Lee e Ayrton
Senna são dois exemplos de quem se propôs a atingir o ápice em sua arte, a ser
o melhor possível, a canalizar a vida nesse único objetivo.
Não vi o argentino típico do futebol: Cabeludo e narigudo. Deve
ser dalguma etnia patagônica mais comum noutra região.
Em 1991, quando estive em Florianópolis, a praia era um
deslumbre. Os biquínis pequeninos, mesmo sem ser de bolinha amarelinha, e gatas
de cair o queixo, monumentos ambulantes, como dizia Joanco. Quando voltei, em
1993, tudo descaracterizado. Nada de gatas deslumbrantes. Os biquínis grandes e
a todo lado os narigudos cabeludos.
Beleza é simetria. Muitas vezes é um conceito pessoal. Se
fores à Alemanha ou Suécia, por exemplo, verás que não é todo mundo bonito.
Associar beleza à cor da pele ou do cabelo é típico da imaturidade, de quem
vive quase só na imaginação. As bogotanas, com traços bem indígenas, bem
branquinhas, são lindas, como são muito lindas as limenhas, indiazinhas mais
escuras, como as tipo índias do Xingu, de Belém do Pará, igualmente lindas. Mas
em Santiago, Buenosaires e Montevidéu não vi essa beleza, talvez porque se
aproxime do comum ao que estamos acostumados.
Vi na comunidade internética Taringa alguns comentários, e
até postagens, bem nazistóides, falando de arianidade, tendo a Argentina como
branca, etc. Mas não é o caso de polemizar. É um trabalho pra psiquiatras e a
polícia.
Pelo que vi em Buenosaires, não tem essa brancura toda que alguns
imaginam. Batendo perna a todo lado se vê uma população variada como do centro
de São Paulo ou mesmo de Campo Grande.
Quando escaneei Fantástica
ilha de Páscoa, de Francis Mazière, comentei com minha correspondente
chilena sobre a afirmação do autor de que o Chile é um país branco. Concordou
comigo de que essa idéia é real só na imaginação do autor.
Os negros tiveram participação ativa na formação dos países
platinos. Nas guerras também. Tal qual os escravos brasileiros, formando grosso
contingente na linha-de-frente na guerra do Paraguai. O tango, por exemplo, tal
qual o jaz, é de origem negra. E o Carnaval montevideano tem muito a ver com o
brasileiro. Mas onde estão os negros? Muito simples: Diluídos na população,
miscigenados. Como em Minas Gerais, muito miscigenado, onde predominam
moreninhas de pele parda muito lindas.
Eis um artigo, mostrando que Buenosaires foi fundada por
paraguaios:
Coleção
de cartão-postal de Joanco
sexta-feira, 7 de outubro de 2016
Formato muito grande.
Teve de ser fotografado
É um quadrinho que
se destaca pela qualidade criativa do enredo, mais verossimilhança histórica
(embora nem tanto), sem balão nem valentia exagerada.
Os enredos são
muito criativos, fugindo um pouco do clichê dos quadrinhos em geral: O excesso
de valentia. Apesar do cuidado do autor, Haroldo Foster, em cuidar muito o
cenário e vestuário conforme a realidade histórica, os enredos vão do mais ao
menos verossímil, chegando ao inverossímil, e descamba muito à fantasia,
principalmente pondo em cena rei Artur, távola redonda, Camelote e mago Merlim,
que são personagens fictícias.
Essas personagens
lendárias são de era muito anterior à medieval. Sprague de Camp, em Cidadelas do mistério, disse que situar
o rei Artur, que nunca existiu, na idade média, com sua cavalaria andante, é um
anacronismo como imaginar Colombo desembarcando na América com aviões e helicópteros.
Aqui o contato
escandinavo-pele-vermelha é apresentado como origem do mito do deus branco
entre os ameríndios.
A viagem dos
viquingues à América, embora aqui em contexto fantasioso, é um fato histórico. A
chegada dos viquingues coincidiu cuma revolução nos costumes e intensa
transformação social nas tribos pele-vermelha.
A incursão
da Grinçante: Inaugurada pela viagem de Leif no ano 1000, a história da América
viquingue termina com a incursão da Grinçante, efetuada nos anos 1354–1362. Já
não se trata da busca a um paraíso mas trazer de volta as ovelhas desgarradas
da Igreja.
Pierre Carnac, A Atlântida de Cristóvão Colombo
Coleção
de cartão-postal de Joanco
domingo, 2 de outubro de 2016
Cambate
(Deve ser a refarma artográfica)
+ cancer
e o ponto final
Crônica
buenairense-montevideana, 2016
Capítulo 1
Bons
Ares ● O
quê é argentina ● O
carrinho do cansa-mão ●
Susto na chegada ●
98%∞
Buenos Aires e Montevidéu ficam pertinho. Então deu pra
matar dois coelhos duma cajadada. Uma semana em Bons Ares e um fim-de-semana em
Montevidéu. Nada mau.
Sobre a etimologia buenairense parece que os nativos não
sabem. Só se supõe o óbvio: Que é por causa dalgum vento fresco.
Vejamos a definição de argentina,
segundo o Dicionário de mineralogia com ênfase em gemologia, https://books.google.com.br/books?id=WhGi97Ey61cC&pg=PT52&lpg=PT52&dq=argentina+sulfeto+de+prata&source=bl&ots=TQKgQZ2drV&sig=SA3ZlC187rd1uBcCWWkrvjdKj2Y&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwjsy_fQkLDPAhXFfZAKHagRC2AQ6AEINzAC#v=onepage&q=argentina%20sulfeto%20de%20prata&f=false:
Argentina: Variedade de calcita branca, nacarada, formando lamelas onduladas. Do
latim argentinus, prateado, pela cor e brilho. Não
confundir com argentita.
Argentita: Sulfeto de prata, Ag2S, com 87,1% de prata, importante
fonte desse metal. Dimorfo cúbico da acantita, tem cor cinzenta, brilho
metálico, é séctil e maleável. Dureza 2,0–2,5. D 7,30. Do latim argentum,
prata. Não confundir com argentina.
Ramão brincará um
pouco pra que a gata Christie não sinta muito minha falta, e uma dose extra de
ração, pois agora aparece um amigo, um gato preto, que aparece pra filar ração,
sempre ronronando triste. Chora mais que dueto de Leonardo com Morris Albert.
Do aeroporto de Buracópolis, antiga Campo Grande, na
madrugada de 6 de setembro, a Guarulhos, pra passar um dia inteiro. Cum livro
de sudoco difícil o dia passou célere. No mais os mesmos golpistas de sempre,
assediando quem passa perto do balcão, pra fingir brindar uma maleta e angariar
assinatura pra Veja, etc. Não se pode
passar perto do balcão desse pessoal, que fica mosqueando igual os vendedores
de fruta do mercadão paulistano.
Além da feiúra, desconforto e desumanidade do ambiente, com
tanto espaço mas sem bagageiro nem pousada, tem os carrinhos novos. Um novo
sistema, que só destrava a roda quando se aperta o guidão. Mas o problema é que
tem de apertar pra valer. Como brasileiro não gosta de manutenção, virou o
carrinho cansa-mão. Só trocou a tortura de segurar mala pesada pela de apertar
forte o guidão pràs rodinhas deslizarem. Trocou 6 por meia-dúzia. Na próxima
viagem terei de levar uma morsa na bagagem-de-mão. Quero achar o engenheiro
autor dessa idéia, pra dar uns cascudos. Merece o troféu Burro.
Esse engenheiro deveria trabalhar na Microsoft, já que é bom
em melhorar uma coisa mas estragar outra. No Windows 10 a busca, que era super
eficiente, não funciona mais. Ficou misturada com a busca internética, uma
barafunda infernal onde nada mais se acha.
Um carrinho que só anda com o peso da mão dalguém segurando,
pra não desembestar numa ladeira. Parece uma idéia boa, mas não aqui, onde
ninguém quer inovar nem fazer manutenção. Os primeiros que vi, em Santiago,
eram novos, suaves, bem lubrificados, liberando as rodas sob o natural peso das
mãos. Mas esses nossos, verdadeiras mulas empacadas, devem ser refugo importado
de lá, muito piores que os de supermercado.
Nos horríveis telões o lema Vás ao cinema. Deixa óbvio que o público dos cinemas está caindo.
Espero que continue caindo, pois só gente alienada vai ver tanto lixo.
Como nas outras vezes, vez-e-outra soava o aviso, uma voz
feminina avisando em português e castelhano, pra não comprar de ambulante no
âmbito do aeroporto. Assim se colabora evitando produtos irregulares e
exploração infantil. Na verdade é só pra proteger os comerciantes dali, com
produtos caríssimos, explorando o viajante. Todo mundo sabe que em xópim e
aeroporto é tudo muito caro e muito ruim.
Aquilo é uma gravação. Não é alguém falando ao vivo, de
improviso. Não seria difícil colocar uma moça que fale um castelhano natural em
vez do sotaque forte duma óbvia brasileira que nunca falou castelhano. Na
descida na vinda o comandante anunciou a chegada num português quase sem
sotaque, e não era gravação.
Outra coisa esquisita é que quando se faz o chequim e se
recebe ali a passagem com número de portão, quando se vai ao embarque se tem de
ficar sempre conferindo esse portão no telão, pois raramente ele não muda!
Algumas vezes se tem de ir longe, correndo, ao novo portão!
Se não cápsula pra dormir, ao menos pra guardar bagagem. Seria
um filão rendoso, pois muita gente fica muitas horas presa ali por causa da
bagagem, quando poderia ter mais mobilidade ou mesmo ir passear na cidade. Como
nossos políticos e empresários são cegos!
Nessa viagem muita aventura. Na comunidade Taringa uma
postagem sobre as aerolinhas dizia que a Aerolíneas
argentinas é a pior de todas. Deve ser, porque uma atendente do chequim consultou
meu papel no sistema e me direcionou à Gol,
dizendo que é a Gol quem opera aquele
trecho, de Guarulhos a Buenos Aires. E a Gol
disse que não. Que nalguns casos é, noutros casos não. Não era.
O caso era que minha passagem foi comprada na Edestinos. Se perdesse o vôo teria de
comprar tudo de novo, pois o sistema derruba toda a passagem restante. Ainda compensa, pois a Edestinos encontra promoções que nem a própria aerolinha tem. É como
um investimento: Se pode ganhar num período e nalguns momentos perder. Se não
ficar perdendo vôo, compensa.
Agora, rumo a Bons Ares. Deve ser o primeiro lugar sem
alguém dizer que não gosta de argentino.
A chegada, na madrugada, foi uma aventura. Quando já
despontavam as luzes da cidade e a roda já tocava o chão, o avião arremeteu. O pessoal
gritou de susto e começou a rezar. Logo soou um aviso de que tudo foi por causa
dum vendaval. Suspiros de alívio. O avião ficou meia hora dando volta. Claro que
também o fato de que o piloto tem de esperar nova autorização de pouso, pois
nesse intervalo pode estar chegando outro avião. Quando corriam gotas na janela
dava pra pensar que estava descendo, pois nuvem fica baixo, mas logo subia de
novo. Era uma espessa camada de nuvem cinzenta, como conferi ao chegar, com insistente
garoa fina, que ofuscava as luzes da cidade, mas sem raio. A cada volta
aparecia uma grande bola de luz fosca.
— Aiaiai!
Só faltava ser caçado por um ufo! Gosto de ler e assistir esses casos de
mistério e enigma mas não quero ser personagem.
Era só
um ponto onde estava a cidade ao longe, ofuscada pelas nuvens.
Quando finalmente pousou foi um aplauso geral.
Se sabe que os momentos mais vulneráveis num vôo são a
partida e o pouso.
Dali entramos numa jardineira (deve ser o nome daquele
ônibus que mais parece bonde, pra transportar passageiros dentro do aeroporto),
em direção à esteira de bagagem. Ali um grupo de brasileiros rumo a Uxuaia não
queria continuar viagem imediatamente, assustado. Dizia que as aeromoças
estavam brancas de susto, que decerto aquele susto foi o primeiro.
No salão das esteiras nada de telão indicando o número de
vôo e o número de esteira correspondente, de modo que eu corria duma a outra. Numa
o grupo de brasileiros: É aqui,
não é aqui…
Os carrinhos estavam longe mas estavam lá. Felizmente não
são do tipo cansa-mão. Até agora Bogotá é o único com a esquisitice do carrinho
ser pago.
Foi outra meia hora até a esteira funcionar. Deu até pra
pensar que na verdade morremos e que passaríamos a eternidade ao redor da
esteira. Enquanto isso um funcionário de casacão, que era sósia de Murilo Rosa
naquela minissérie onde representava um tenente que caçava Lampião, orientava o
pessoal, com voz estentórea, perguntando quem é da conexão tal, da outra tal… A
todo momento subia à esteira pra explicar os procedimentos e responder às
perguntas.
Fiquei pensando como seria se a esteira começasse a
funcionar de repente…
E o grupo de brasileiros… A moça contando que uma pista tal
dava muito acidente. Estudaram o caso e descobriram que a pista tinha muito
defeito porque foi feita apressada, pra cumprir prazo. Que já passou susto
assim, que o pai não deixou mãe e irmãs voarem juntas, porque se a nave caísse
ficaria sozinho. Que se perdesse a família preferiria ir junto, porque não
queria ficar sozinha no mundo…
Fiquei pensando na bobeira que é pensar assim. Já passei
isso… Mas isso é outra história.
O primeiro dia na cidade foi de céu cinzento, garoa e frio.
Fim do primeiro capítulo
Agora liberarei espaço no gemeio, porque prometem espaço
infinito mas aparece a mensagem 98%
cheio. Liberar espaço ou comprar espaço adicional.
98% de infinito é infinito, mas decerto os gemeeiros fugiam
da aula de matemática.
Não é só político que promete mas não cumpre.
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